Em
que sentido morreu Jesus por nossos pecados? Como é explicado o fato no Novo
Testamento? A resposta encontra-se nas seguintes palavras-chave aplicadas à
morte de Cristo: Expiação, Propiciação, Substituição, Redenção
e Reconciliação.
1. Expiação.
A
palavra expiação no hebraico significa literalmente 'cobrir', e é traduzida pelas seguintes palavras: fazer expiação, purificar, quitar, reconciliar, fazer reconciliação, pacificar,
ser misericordioso.
A expiação,
no original, inclui a ideia de cobrir, tanto os pecados (Sal. 78:38;79:9; Lev.
5:18) como também o pecador. (Lev. 4:20.) Expiar o pecado é ocultar o pecado da
vista de Deus de modo que o pecador perca seu poder de provocar a ira divina.
Citamos aqui o Pr. Alfred Cave: A
ideia expressa pelo original hebraico da palavra traduzida "expiar", era "cobrir" e "cobertura", não no sentido de
torná-lo invisível a Jeová , mas no sentido de ocupar sua vista com outra
coisa, de neutralizar o pecado, por assim dizer, de desarmá-lo, de torná-lo
inerte para provocar a justa ira de Deus.
Expiar
o pecado... era arrojar, por assim dizer, um véu sobre o pecado tão provocante,
de modo que o véu., e não o pecado, fosse visível; era colocar lado a lado com
o pecado algo tão atraente que cativasse completamente a atenção. A figura que
o Novo Testamento usa ao falar das vestes novas (de justiça), usa-a o Antigo
Testamento ao falar da "expiação".
Quando
se fazia expiação sob a lei, era como se o olho divino, que se havia acendido
pela presença do pecado e a impureza, fosse aquietado pela vestidura posta ao
seu derredor; ou, usando uma figura muito mais moderna, porém igualmente
apropriada, era como se o pecador, exposto a uma descarga elétrica da ira
divina, houvesse sido repentinamente envolto e isolado. A expiação significa
cobrir de tal maneira o pecador, que seu pecado era invisível ou inexistente no
sentido de que já não podia estar entre ele e seu Criador. Quando o sangue era
aplicado ao altar pelo sacerdote, o israelita sentia a segurança de que a
promessa feita a seus antecessores se faria real para ele. "Vendo eu sangue, passarei por cima de vós"
(Êxo. 12:13).
Quais eram o efeitos da expiação ou da
cobertura?
O
pecado era apagado (Jer. 18:23; Isa. 43:25; 44:22); removido (Isa.6:7); coberto
(Sal. 32:1); lançado nas profundidades do mar (Miq. 7:19); perdoado (Sal.
78:38). Todos esses termos ensinam que o pecado é coberto de modo que seus
efeitos sejam removidos, afastados da vista, invalidados, desfeitos. Jeová já
não vê nem sofre influência alguma dele.
A
morte de Cristo foi uma morte expiatória, porque seu propósito era apagar o
pecado. (Heb. 9:26, 28; 2:17; 10:12-14; 9:14.) Foi uma morte sacrificial ou uma
morte que tinha relação com o pecado.
Qual era essa relação?
"Levando
ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro" (1Ped. 2:24).
"Aquele que não conheceu pecado, o
fez pecado por nós, para que nele fôssemos feitos justiça de Deus" (2
Cor. 5:21) Expiar o pecado significa levá-lo embora, de modo que ele é afastado
do transgressor, o qual é considerado, então, como justificado de toda a
injustiça, purificado de contaminação e santificado para pertencer ao povo de
Deus. Uma palavra hebraica usada para descrever a purificação significa,
literalmente, "quitar o pecado". Pela morte expiatória de Cristo os
pecadores são purificados do pecado e logo feitos participantes da natureza de
Cristo. Eles morrem para o pecado a fim de viverem para Cristo.
2. Propiciação.
Crê-se que a palavra
propiciação tem sua origem em uma palavra latina "propõe", que significa "perto de". Assim se nota que a palavra significa juntar,
tornar favorável. O sacrifício de propiciação traz o homem para perto de Deus,
reconcilia-o com Deus fazendo expiação por suas transgressões, ganhando a graça
e favor.
Em sua misericórdia, Deus
aceita o dom propiciatório e restaura o pecador a seu amor. Esse também é o
sentido da palavra grega como é usada no Novo Testamento. Propiciar é aplacar a
ira de um Deus santo pela oferenda dum sacrifício expiatório. Cristo é descrito
como sendo essa propiciação (Rom. 3:25: 1 João 2:4; 4).
O pecado mantém o homem
distanciado de Deus; mas Cristo tratou de tal maneira o assunto do pecado, a
favor do homem, que o seu poder separador foi anulado. Portanto, agora o homem
pode "chegar-se" a Deus "em seu nome". O acesso a Deus, o
mais sublime dos privilégios, foi comprado por grande preço: o sangue de
Cristo.
Assim escreve o Dr. James Denney: E
assim como no Antigo Testamento todo objeto usado na adoração tinha que ser
aspergido com sangue expiatório, assim também todas as partes da adoração
cristã; todas as nossas aproximações a Deus devem descansar conscientemente
sobre a expiação. Deve-se sentir que é um privilégio de inestimável valor; deve
ser permeado com o sentimento da paixão de Cristo e com o amor com que ele nos
amou quando sofreu por nossos pecados de uma vez para sempre, o justo pelos
injustos para chegar-nos a Deus.
A
palavra "propiciação" em
Romanos 3:25 é tradução da palavra grega "hilasterion", que se encontra também em Heb. 9:5 onde é
traduzida como "propiciatório".
No hebraico, "propiciatório" significa
literalmente "coberta", e,
tanto no hebraico como no grego, a palavra expressa o pensamento de um
sacrifício. Refere-se à arca da aliança (Êxo. 25:10-22) que estava composta de
duas partes: primeira, a arca,
representando o trono do justo governante de Israel, contendo as tábuas da lei
como a expressão de sua justa vontade; segunda, a coberta, ou tampa, conhecida
como "propiciatório", coroada com figuras angélicas chamadas
querubins. Duas lições salientes eram comunicadas por essa mobília: primeira,
as tábuas da lei ensinavam que Deus era um Deus justo que não passaria por alto
o pecado e que devia executar seus decretos e castigar os ímpios. Como podia
uma nação pecaminosa viver ante sua face?
O
propiciatório, que cobria a lei, era o lugar onde se aspergia o sangue uma vez
por ano para fazer expiação pelos pecados do povo. Era o lugar onde o pecado
era coberto, e ensinava a lição de que Deus, que é justo, pode perfeitamente
perdoar o pecado por causa dum sacrifício expiatório. Por meio do sangue
expiatório, aquilo que é um trono de juízo se converte em trono de graça.
A arca e o propiciatório
ilustram o problema resolvido pela expiação. O problema e sua solução são
declarados em Rom. 3: 24-26, onde lemos: "sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há
em Cristo Jesus, ao qual Deus propôs para propiciação (um sacrifício
expiatório) pela fé no seu sangue, para demonstrar a sua justiça pela remissão
dos pecados dantes cometidos (demonstrar que a aparente demora em executar o
juízo não significa que Deus passou por alto o pecado) sob a paciência de Deus;
para demonstração da sua justiça, neste tempo presente (sua maneira de fazer
justos os pecadores), para que ele seja justo (infligir o devido castigo pelo
pecado), e justificador (remover o castigo pelo pecado) daquele que tem fé em
Jesus".
Como
pode Deus realmente infligir o castigo do pecado e ao mesmo tempo cancelar esse
castigo? Deus mesmo tomou o castigo na pessoa de seu Filho, e desta maneira
abriu o caminho para o perdão do culpado. Sua lei foi honrada e o pecador foi
salvo. O pecado foi expiado e Deus foi propiciado. Os homens podem entender
como Deus pode ser justo e castigar, ser misericordioso e perdoar; mas a
maneira como pode Deus ser justo no ato de justificar ao culpado, é para eles
um enigma. O Calvário resolve o problema. É preciso esclarecer o fato de que a
propiciação foi uma verdadeira transação, porque alguns ensinam que a expiação
foi simplesmente uma demonstração do amor de Deus e de Cristo, com a intenção
de comover o pecador ao arrependimento. Esse certamente é um dos efeitos da
expiação (1 João 3:16), mas não representa o todo da expiação. Por exemplo,
poderíamos pular para dentro dum rio e afogarmo-nos à vista de uma pessoa muito
pobre a fim de convencê-la do nosso amor por ela; mas esse ato não pagaria o
aluguel da casa nem a conta do fornecedor que ele devesse! A obra expiatória de
Cristo foi uma verdadeira transação que removeu um verdadeiro obstáculo entre
nós e Deus, e pagou a dívida que não podíamos pagar.
3. Substituição.
Os sacrifícios do Antigo Testamento eram
substitutos por natureza; eram considerados como algo a que se procedia, no
altar, para o israelita, que não podia fazê-lo por si mesmo. O altar
representava o pecador; a vitima era o substituto do israelita para ser aceita
em seu favor. Da mesma forma Cristo, na cruz, fez por nós o que não podíamos
fazer por nos mesmos, e qualquer que seja a nossa necessidade, somos aceitos
"por sua causa". Se oferecemos a Deus nosso arrependimento, gratidão
ou consagração, fazemo-lo "em seu nome", pois ele é o Sacrifício por
meio do qual chegamos a Deus o Pai. O pensamento de substituição é saliente nos
sacrifícios do Antigo Testamento, onde o sangue da vitima é considerado como
uma coberta ou como fazendo expiação pela alma do ofertante. No capítulo em que
os sacrifícios do Antigo Testamento alcançam seu maior significado (Isa. 53) lemos:
"Verdadeiramente" ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as
nossas dores levou sobre si... mas ele foi ferido pelas nossas transgressões, e
moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele,
e pelas suas pisaduras fomos sarados, (vers. 4, 5). Todas essas expressões
apresentam o Servo de Jeová como levando o castigo que devia cair sobre outros,
a fim de "justificar a muitos"; e "levar as iniquidades
deles". Cristo, sendo o Filho de Deus, pôde oferecer um sacrifício de valor
eterno e infinito. Havendo assumido a natureza humana, Pôde identificar-se com
o gênero humano e assim sofrer o castigo que era nosso, a fim de que pudéssemos
escapar. Isso explica a exclamação: "Deus meu, Deus meu, por que me
desamparaste?" Ele que era sem pecado por natureza, que nunca havia
cometido um pecado sequer em sua vida, se fez pecador (ou tomou o lugar do
pecador). Nas palavras de Paulo: "Aquele que não conheceu pecado, o fez
pecado por nós" (2 Cor. 5:21). Nas palavras de Pedro: "Levando ele mesmo
em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro" (1 Ped. 2:24).
4. Redenção.
A
palavra redimir, tanto no Antigo como no Novo Testamento, significa tornar a
comprar por um preço; livrar da servidão por preço, comprar no mercado e
retirar do mercado. O senhor Jesus é um Redentor e sua obra expiatória é
descrita como uma redenção. (Mat. 20:28; Apoc. 5:9; 14:3, 4; Gál. 3:13; 4:5;
Tito 2:14; 1 Ped. 1:18.) A mais interessante ilustração de redenção se encontra
no Antigo Testamento, na lei sobre a redenção dum parente. (Lev. 25:47-49.)
Segundo essa lei, um homem que houvesse vendido sua propriedade e se houvesse
vendido a si mesmo como escravo, por causa de alguma dívida, podia recuperar,
tanto sua terra como sua liberdade, em qualquer tempo, sob a condição de que
fosse redimido por um homem que possuísse as seguintes qualidades: Primeira,
deveria ser parente do homem; segunda deveria estar disposto a redimi-lo ou
comprá-lo novamente; terceira, deveria ter com que pagar o preço. O Senhor
Jesus Cristo reuniu em si essas três qualidades: Fez-se nosso parente,
assumindo nossa natureza; estava disposto a dar tudo para redimir-nos (2 Cor.
8:9); e, sendo divino, pôde pagar o preço... seu próprio sangue precioso. O
fato da redenção destaca o alto preço da salvação e, por conseguinte, deve ser
levado em grande consideração. Quando certos crentes em Corinto se descuidaram
de sua maneira de viver, Paulo assim os admoestou: "não sabeis... que não
sois de vós mesmos? porque fostes comprados por bom preço; glorificai pois a
Deus no vosso corpo e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus" (1
Cor. 6:19. 20). Certa vez Jesus disse: "Que aproveitaria ao homem ganhar
todo o mundo e perder a sua alma? Ou que daria o homem pelo resgate da sua
alma?" (Mar. 8:36, 37). Com essa expressão ele quis dizer que a alma, a
verdadeira vida do homem, podia perder-se ou arruinar-se; e perdendo-se não
podia haver compensação por ela, porque não havia meios de tornar a comprá-la.
Os homens ricos poderão jactar-se de suas riquezas e nelas confiar, porém o
poder delas é limitado. O Salmista disse: "Nenhum deles de modo algum pode
remir a seu irmão, ou dar a Deus o resgate dele (pois a redenção da sua alma é
caríssima, e seus recursos se esgotariam antes) por isso tão pouco viver para
sempre ou deixar de ver a corrupção" (Sal 49: 7-9). Mas uma vez que as
almas de multidões já foram "confiscadas", por assim dizer, por
viverem no pecado, e não podem ser redimidas por meios humanos, que se pode
fazer em favor delas? O Filho do homem veio ao mundo "para dar a sua vida
em resgate (ou para redenção) de muitos (Mat. 20:28). O supremo objetivo de sua
vinda ao mundo foi dar sua vida como preço de resgate para que aqueles, cujas
almas foram "confiscadas", pudessem recuperá-las. As vidas
(espirituais) de muitos, "confiscadas", são libertadas pela rendição
da vida por parte de Cristo. Pedro disse a seus leitores que eles foram
resgatados de sua vã maneira de viver, que por tradição (pela rotina ou
costumes), receberam dos seus pais (1 Pedro 1:18). A palavra "vã" significa
"vazia", ou aquilo que não satisfaz. A vida, antes de entrar em
contato com a morte de Cristo, é inútil e vã é andar às apalpadelas, procurando
uma coisa que nunca poderá ser encontrada. Com todos os esforços não logra
descobrir a realidade; não tem fruto permanente.
"Que adianta tudo isso?"
exclamam muitas pessoas. Cristo nos redimiu dessa servidão. Quando o poder da
morte expiatória de Cristo tem contato com a vida de alguém, essa vida desfruta
de grande satisfação. não está mais escravizada às tradições de ancestrais ou
limitada à rotina ou aos costumes estabelecidos. Antes, as ações do cristão
surgem duma nova vida que veio a existir pelo poder da morte de Cristo. A morte
de Cristo, sendo uma morte pelo pecado, liberta e "toma a criar" a
alma.
5. Reconciliação.
"Tudo
isto provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por Jesus Cristo, e nos
deu o ministério da reconciliação; isto é, Deus estava em Cristo reconciliando
consigo o mundo, não lhes imputando os seus pecados; e pôs em nos a palavra da
reconciliação" (2 Cor. 5: 18, 19.) Quando éramos inimigos, fomos
reconciliados com Deus pela morte do seu Filho (Rom. 5:10). Homens que em outro
tempo eram estranhos entre si e inimigos no entendimento pelas suas obras más,
agora no corpo da sua carne, pela morte, foram reconciliados (Col. 1:21).
Muitas vezes a expiação é mal entendida e, por conseguinte, mal interpretada.
Alguns imaginam que a expiação significa que Deus estava irado com o pecador, e
que se afastou, mal-humorado, até que se aplacasse a ira, quando seu Filho se
ofereceu a pagar a pena. Em outras palavras, pensam eles, Deus teve que ser
reconciliado com o pecador. Essa idéia, entretanto é uma caricatura da
verdadeira doutrina. Através das Escrituras vemos que é Deus, a parte ofendida,
quem toma a iniciativa em prover expiação pelo homem. Foi Deus quem vestiu
nossos primeiros pais; é o Senhor quem ordena os sacrifícios expiatórios; foi
Deus quem enviou e deu seu Filho em sacrifício pela humanidade. O próprio Deus
é o Autor da redenção do homem. Ainda que sua majestade tenha sido ofendida
pelo pecado do homem, sua santidade, naturalmente, deve reagir contra o pecado,
contudo, ele não deseja que o pecador pereça (Ezeq. 33:11), e, sim, que se
arrependa e seja salvo. Paulo não disse que Deus foi reconciliado com o homem,
mas sim que Deus fez algo a fim de reconciliar consigo o homem. Esse ato de
reconciliação é uma obra consumada; é uma obra realizada em beneficio dos
homens, de maneira que, à vista de Deus, o mundo inteiro está reconciliado. Resta
somente que o evangelista a proclame e que o indivíduo a receba. A morte de
Cristo tornou possível a reconciliação de todo o gênero humano com Deus; cada
indivíduo deve torná-la real. Essa, em essência, é a mensagem do evangelho; a
morte de Cristo foi uma obra consumada de reconciliação, efetuada independente
de nós, a um custo inestimável, para a qual são chamados os homens mediante um
ministério de reconciliação.
Adaptação: Escola Bíblica ECB
Fonte: Conhecendo as Doutrinas Bíblica
Autor: Myer Pearlman